Opinião
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03 de Outubro de 2010
Cada eleitor um juiz
Para o cientista político italiano Norberto Bobbio "quando falamos de democracia, a primeira imagem que nos vem à mente é o dia das eleições".
O Brasil tem mais de quinhentos anos de eleições. Os primeiros colonizadores elegiam os administradores das comunidades rurais, vilas e cidades. Os bandeirantes lideraram o processo. Historicamente, a primeira eleição brasileira ocorreu em 1532, cidade de São Vicente, para eleger o Conselho Municipal.
Neste 3 de outubro, 135 milhões de brasileiros irão às urnas para eleger o presidente da república, governadores de estados, 2/3 do senado, câmara dos deputados e assembléias legislativas estaduais. A comparação com a eleição de 2006 registra um crescimento de 7.8% no eleitorado. A mulher tem maioria (51.8%), contra 48% dos homens. Um quarto dos eleitores situa-se na faixa etária de 25 a 34 anos.
Mesmo diante de falhas imperdoáveis do nosso sistema eleitoral, o direito de votar é exercido com relativa liberdade no Brasil. As maiores limitações estão na fragilidade dos partidos e na nefasta influência do poder econômico e político.
A eleição de 2010 teve característica singular. O processo eleitoral foi totalmente judicializado. Os juízes não se limitaram a aplicar a lei. O judiciário fez a lei, através de interpretações e analogias. Editou "recomendações", deixando no ar ameaças de punições excessivas. Durante a campanha, fiscais leigos em conhecimentos jurídicos criaram situações de constrangimento e de visível abuso de poder. Aqueles candidatos sem recursos financeiros, que desejavam falar ao povo em comícios relâmpagos, foram impedidos de portar cartazes pelas medições ridículas de centímetro a mais ou a menos e no uso de propaganda sonora, as restrições absurdas de decibéis nos serviços de som. Livres e impunes ficaram os "cabos eleitorais", azeitados pelas moedas da corrupção.
Tudo aconteceu, em razão da criminosa omissão do Congresso Nacional, ao demonstrar incapacidade de aprovar a reforma política. Os partidos faliram, no vendaval do oportunismo. Como não existiu legislação eficiente para coibir os desvios, transferiu-se às regulamentações judiciais, a tarefa de colocar a democracia nos trilhos. Missão impossível de ser alcançada isoladamente!
O resultado é que o país assistiu verdadeiro adultério partidário, com a justiça eleitoral impondo de cima para baixo a fidelidade partidária, sem levar em conta a democratização interna dos partidos, além de permitir coligações antagônicas, que uniram azeite a água. A incoerência e o oportunismo tomaram o lugar dos programas partidários e das propostas sérias. A campanha foi fria, incolor e sem emoção. Nada apresentou de novo, salvo acomodações políticas. As cúpulas tiveram liberdade ampla para cuidar da própria sobrevivência. Quando convocada, a justiça manifestou-se, sem levar em consideração o "caráter nacional" dos partidos (artigo 17, I, da Constituição), que virou letra morta.
Hoje, a única esperança será cada eleitor transformar-se em juiz e dá o seu voto na forma de uma sentença irrecorrível, aplicando o critério da lei da "ficha limpa" na escolha dos seus candidatos, para evitar que prevaleça a vacilação do STF ao deixar de julgar, em caráter definitivo, a vigência da nova legislação. Se o eleitor não for um juiz severo, na preservação da moralidade pública, o país corre o risco da lei ser considerada inconstitucional e beneficiar os traficantes de influencia e assaltantes dos cofres públicos.Chegou a hora do tudo ou nada!
- Ney Lopes – Jornalista; advogado, professor
de direito constitucional e ex-deputado federal.
Publicado aos domingos nos jornais
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