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Opinião

  • 03 de Junho de 2000

    A CPI E PÍLULA MILAGROSA

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    A CPI E PÍLULA MILAGROSA

    Fim de CPI e a história se repete: terminou ou não terminou em pizza? No caso da CPI dos Medicamentos, após 180 dias de trabalho árduo, centenas de horas de depoimentos e dezenas de milhares de documentos bancários analisados, que tal encarar essa questão pelo lado oposto: que tal tentar entender no que a CPI não terminou? Aceito o desafio, arriscaria uma resposta: a CPI não terminou em pílula! Em pílula milagrosa.

    Por pílula milagrosa, compreenda-se toda a sorte de  soluções simplistas, maniqueísmos enganosos, factóides inócuos, generalizações mal intencionadas. Enfim, aquele arsenal de fumaça que serve mais para alimentar os holofotes do que para a compreensão e solução concreta dos problemas. É preciso admitir que a CPI efetivamente não fez milagres. Mas quando se trata de um dos setores mais complexos, dinâmicos e sensíveis do país – como é o setor farmacêutico – também é forçoso reconhecer: milagres definitivamente não existem. E é melhor que assim seja. Vejamos porque.

    OPINIÃO PÚBLICA

    Após uma certa experiência parlamentar, acumulada ao longo de  cinco mandatos federais, pude acompanhar de perto muitas das mais ferrenhas e conflituosas investigações, levadas a cabo pelo Legislativo. Nessas ocasiões, sempre chama atenção a candente sede de Justiça da Opinião Pública. O cidadão quer punições, quer ver os tubarões que se locupletam sendo punidos com rigor. Ninguém agüenta mais tanta impunidade. Todos sentimos revolta. O problema é que as CPI, muitas vezes, acabam servindo apenas como um patíbulo para a expiação momentânea de nossas angústias mais profundas, justamente porque existe uma certa ânsia por milagres. E é aí que mora o perigo, porque abre-se um amplo espaço para manipulações grosseiras da vontade popular.

    Basicamente, existem dois tipos de manipulação da Opinião Pública, quando o assunto é CPI. A primeira delas poderia ser chamada de “Operação Casablanca”, numa referência à clássica película que consagrou a frase “prendam-se os suspeitos de sempre”. Na “Operação Casablanca”, basta jogar algemas nos pulsos de um presidente de laboratório, de preferência multinacional, de olhos claros, sotaque e cara de gringo, apostando que o noticiário da noite vai cumprir o seu papel de levar sangue para a choldra.

    A outra forma de uma CPI não fazer nada – mas aparecer aos olhos da Opinião Pública como muito, muito ativa – é inventar soluções estúpidas, paliativas. E inviáveis. Chamemos isso de “Operação Tiro Certeiro”. No caso específico da CPI dos Medicamentos, nada seria mais fácil do que criar um factóide estrondoso. Por que não congelar o preço dos medicamentos, impedindo novos reajustes pelo prazo de cinco (não, dez), não, 20 anos? Seria a vingança contra os laboratórios do mal e seus preços escorchantes! Só que não resolveria nada – infelizmente. Se congelamento domasse o capitalismo, o binômio União Soviética/Rússia (que derrotou Napoleão e Hitler) estaria aí até hoje e os Estados Unidos é que teriam perdido a Guerra Fria.

    RESULTADOS CONCRETOS

    Na hora de avaliar o resultado palpável da CPI dos Medicamentos, é preciso reconhecer: não produzimos ilusões de ótica. E acho que a Opinião Pública só tem a ganhar com isso. Faltou estardalhaço, é verdade. Mas sobraram ações silenciosas – e concretas. O leitor pode ter certeza: os laboratórios e o setor farmacêutico como um todo não tem o que comemorar.

    Pela primeira vez na História do país, graças à CPI, ficou comprovado que os laboratórios agiram como um cartel, ditando regras, impedindo a queda dos preços dos produtos. O relatório final chega a essa conclusão direta e inquestionável, apresentando fatos. Agora, a bola está com o CADE, o xerife que fiscaliza a livre concorrência. Portanto, “CADE” neles!

    Outro avanço: foi aumentada em seis vezes a multa contra os laboratórios que abusarem nos reajustes. Quem cometer abusos, a partir de agora, vai sofrer onde mais dói: no bolso. Com a quebra de sigilo bancário, fiscal e telefônico de quarenta das maiores empresas do setor, ficou claro que há muitos desvios e dúvidas. Todas essas conclusões e “pistas” estão sendo enviadas para os órgãos técnicos de fiscalização permanente. Receita neles! Ministério Público neles!

    Graças à CPI, pela primeira vez na história do Congresso Nacional, avançou-se muito na compreensão sobre o complexo assunto do superfaturamento dos produtos farmacêuticos. E as análises feitas já foram enviadas para a Receita. Por fim, com a CPI quebrou-se a espinha dorsal do “lobby” contra os genéricos. Produto abominado pelos grandes do setor antes da CPI, o genérico é hoje uma realidade. As empresas tiveram que ceder. Quem ganha com isso é o consumidor. É remédio de boa qualidade a preços mais baixos.

    Enfim, há um conjunto de medidas concretas e pontuais que determinam um novo paradigma para o funcionamento do setor farmacêutico no Brasil. Essas medidas podem não ganhar as manchetes, mas fecham ralos bem específicos por onde escoavam todas as tentativas de controle, por parte da sociedade. Tudo o que os vilões da saúde gostariam é que a CPI tivesse centrado fogo em factóides retumbantes – e vazios – e os deixassem livres para cometer os abusos que quisessem. Mas a CPI trilhou o caminho contrário: centrou sua atenção nos detalhes, propôs mudanças nos detalhes. Pois é aí, nos detalhes, como se diz, que mora o Diabo. A CPI não ministrou uma pílula milagrosa, mas pode estar certo: os vilões dos remédios devem estar consumindo analgésicos como nunca!

    Coluna Publicada aos domingos
    nos jornais O POTI e GAZETA DO OESTE
    Natal e Mossoró - Rio Grande do Norte


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