Marca Maxmeio

Opinião

  • 28 de Fevereiro de 2004

    AGORA, SOMENTE SAUDADE

    2004-all.jpg

     

     

     

    AGORA, SOMENTE SAUDADE

    Morreu José Cortez Pereira de Araújo, ex-governador do RN (1971/1975). Entrei na vida pública pelas suas mãos. Ele teve a coragem de montar um governo inovador. Com 26 anos, sem nenhum aval poderoso, fui o seu primeiro Chefe da Casa Civil. Pela primeira vez na história estadual, um governante promoveu antes de assumir, com a ajuda de professores da Fundação Getúlio Vargas, curso para a equipe escolhida melhor conhecer o RN e planejar o seu desenvolvimento. Desse curso, participaram os auxiliares recrutados pela competência, todos sem mandatos eletivos e que tinham a sua primeira “chance”, dentre eles, Cassiano Arruda, Flávio Azevedo, Antenor Madruga, Arimar França, Genibaldo Barros, Dalton Melo, Geraldo Bezerra, Edmilson Holanda, Múcio Vilar Ribeiro Dantas, Joanilson de Paula Rêgo, Ubiratan Galvão, Augusto Carlos, Marcos Formiga, Diógenes da Cunha Lima, Osmundo Farias, Jorge Ivan, Rossine Veras, Fernando Guerreiro, Eudes Galvão, Canindé Furtado, Ronaldo Leite, Rubens Pereira, Nogueira Fernandes, Marlênio Cambuim Coutinho, Clovis Gonçalves, Edgar Dantas, Fernando Gomes, Luciano Bezerra, Marcelo Fernandes, Alcimar Almeida, José Pereira de Sá, Valério Mesquita, Marco Aurélio de Sá e outros.

    Fui testemunha ocular da epopéia, em que se transformou a sua passagem pelo Executivo potiguar. Terminou ele e seus amigos, como no relato de Homero, devorados pelo gigante Polifemo, aquele que desafiou Ulysses na gruta do Cíclope. O país vivia clima propício para tais cenas de arbítrio. Os atos institucionais prevaleciam sobre a própria Constituição e autorizavam cassações sumárias por 10 anos (sem direito de defesa). Na expressão de George Orwell “falava-se em liberdade para matá-la; em democracia para destruí-la; em legalidade para negá-la”.

    Os erros de Cortez foram sempre com o desejo de acertar. Os acertos com a intenção de preparar colheita mais fértil no futuro do RN. O seu trabalho foi semelhante àquele conto, em que um velho lavrador, gravemente enfermo, chamou os filhos à cabeceira do leito e falou-lhes que deixaria tesouro de herança a um ou dois pés de profundidade. Depois de sua morte, os filhos puseram-se com todo afã a cavar a terra, que depois de cavada e removida, deu-lhes abundante colheita como recompensa pelo esforço e o trabalho. As gerações atuais cavam o chão potiguar com trabalho e idealismo e colhem frutos dos projetos pioneiros lançados na época do Governo Cortez Pereira.

    Cortez elaborou o primeiro plano de desenvolvimento integrado da história do país – o Ruralnorte – encampado pelo Governo Federal com a denominação de “Polonordeste”.

    Cortez questionou o modelo de desenvolvimento da SUDENE, mudado em 2003, já no governo Lula.

    Cortez criou vinte vilas rurais nas terras devolutas da Serra do Mel e plantou 40 mil hectares de cajueiros para empregar 30 mil desempregados das salinas. A sua idéia era criar classe média rural pelo incentivo à colonização, cultura e industrialização de produtos agrícolas adequados às condições de cada mini-região, tais como, caju, coco, bicho da seda, melão e frutas em geral. Toda essa estratégia é exemplo vivo para uso do Governo Federal no programa dos “sem terras”

    Cortez, para estimular os pequenos salineiros, prejudicados pela mecanização das grandes salinas financiadas pela SUDENE, imaginou a criação de camarão nas áreas de mangue e salinas. Para isto, visitou o Japão, sob verdadeiro tiroteio de injúrias, impropérios e inverdades, criadas no “laboratório político do Estado” e enviadas à imprensa nacional. Acompanhei-o nesta viagem. Lá conhecemos núcleos de carcinicultura em cativeiro.   Ao voltar, mandou equipes técnicas ao exterior e implantou o projeto camarão, extinto após a sua saída do governo. Teve a colaboração de grandes técnicos, dentre eles, o Dr. Tupan Ferreira de Souza, já falecido. Hoje, redescoberto pela iniciativa privada, o camarão é líder das exportações estaduais com três das maiores empresas brasileiras aqui implantadas.

    Cortez criou o pólo têxtil do Estado, através da integração vertical do algodão seridó e a fabricação de tecido. Com postura de estadista e homem de bom coração, deu total apoio à primeira fábrica de tecido norte-rio-grandense, dirigida pelo Sr. Aluízio Alves, que comandava a oposição ao seu governo, mesmo cassado à época.

    Cortez implantou em Touros o projeto Boqueirão para reduzir o êxodo rural, produzir e beneficiar coco e abacaxi; criou e pôs em prática o projeto sericultura para a criação do bicho da seda, permitindo o RN produzir seda de qualidade idêntica à chinesa, o que poderá ser, ainda, redescoberto.

    Cortez estimulou o plantio de café e arroz nas serras do Alto Oeste, fabricação de barrilha em Macau (com grande colaboração do então deputado Florêncio Queiroz) e recuperação de salinas com a disseminação do cooperativismo. Foi ele o grande incentivador do turismo potiguar com a doação de duas áreas para a Editora Abril construir hotéis e a transformação da Casa de Detenção de Natal em “Centro de Turismo”. Estimulou o planejamento familiar. Executou programa de construção de pequenos açudes.

    Cortez foi o governador que fechou totalmente o nosso “anel energético”. Levou Paulo Afonso ao maior número de cidades, mesmo com a agravante da maioria ser pobre, anti-econômicas e provocar prejuízo. Duplicou a BR-101; fez a ligação da ponte de Igapó com a praia da Redinha, usando na pavimentação o método Bripar descoberto pelo estudioso potiguar, Dr. Milson Dantas e deu a Natal recantos agradáveis como o Bosque dos Namorados, a cidade da criança e o início da construção do atual “centro administrativo”.

    Cortez morreu num sábado de carnaval. Poucos tomaram conhecimento. Desceu à tumba, certamente com aquele costumeiro sorriso disfarçado na face. Ele era assim. Nunca aceitou que a ofensa recebida se transformasse em vindita ou revolta. Pregou na vida pública – o que é difícil – a lição de que, quando a política nos traz ofensas, “devemos escrever na areia onde o vento do esquecimento e do perdão se encarregam de apagar. Porém, quando nos faz algo de bom, devemos escrever definitivamente no coração, onde vento nenhum do mundo poderá apagar.”

    Recordo muitos fatos da convivência com Cortez. Um deles, quando visitamos Washington DC, em missão oficial e chegou a notícia, dada por Genibaldo Barros, de que o meu pai agonizava no navio-hospital Hope, em Natal. Ele chorou copiosamente.

    Por todas estas lembranças, escrevo no meu coração as palavras “obrigado e saudade”, onde também o vento jamais poderá apagá-las.

    Coluna Publicada aos domingos
    nos jornais O POTI e GAZETA DO OESTE
    Natal e Mossoró - Rio Grande do Norte



Notice: Undefined variable: categoria in /home/neylopescom/public_html/noticia.php on line 42

Notice: Trying to get property of non-object in /home/neylopescom/public_html/noticia.php on line 42

Notice: Undefined index: pagina in /home/neylopescom/public_html/noticia.php on line 42

Notice: Undefined variable: totalPaginas in /home/neylopescom/public_html/noticia.php on line 42

Notice: Undefined offset: 1 in /home/neylopescom/public_html/restrito/incs/funcoes.php on line 618