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Opinião

  • 14 de Julho de 2012

    Lembranças de Dom Eugenio Sales (I)

    2012-07-15-opiniao

     

    Em 1992, como representante do Parlamento Latino-Americano, sentei-me ao lado do Cardeal D. Eugenio Sales; do ex-vice-presidente dos Estados Unidos, Al Gore e outras autoridades, na mesa principal de um painel de debate, durante a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (ECO 92), realizada no Rio de Janeiro. A certa altura, D. Eugenio cochichou ao meu ouvido: “Você já pensou Ney: eu de Acari e você de Natal sentados nessa mesa, ao lado de tanta gente importante”. Confirmei que D. Eugenio continuava o mesmo padre, simples, afável e brincalhão. Desde os quinze anos de idade (1960), com ele trabalhei no jornal A Ordem, Emissora de Educação Rural de Natal e no chamado “movimento de Natal”. Em 1965, enriquecido com as suas lições de fé e humanismo, transferi-me para o Recife, onde prossegui o curso de Direito e trabalhei como repórter no Diário de Pernambuco, Jornal do Commércio e nas sucursais do Jornal do Brasil, Folha, Manchete e revista “O cruzeiro”. Convivi com os jornalistas Joezil Barros, presidente no nordeste dos Diários Associados, Gaudêncio Torquato, Anchieta Helcias, Camelo, Egidio Serpa, Teixeirinha, Esmaragdo Marroquim, Calazans Fernandes e Zezito Maciel (irmão de Marco Maciel). 

    Em 1966, aos vinte e um anos de idade, resolvi entrar na política. Pedi conselho a D. Eugenio. Ele disse que deveria prosseguir, mas nunca fosse um extremista. Ingressei como membro fundador do MDB, partido político que se opunha a Revolução de 64, sendo candidato a deputado, em pleno período de represália. Tarcísio Monte, que dirigia A ORDEM, obteve autorização de D. Eugenio para publicar artigo de primeira página, considerando-me uma boa opção eleitoral. Nunca esqueci o gesto solidário. Embora com votação surpreendente, o MDB não atingiu o quociente eleitoral.

    Na última terça em São Paulo, os olhos lagrimerajarm ao ler a notícia de que o “padre de Acari”, como gostava de ser chamado, falecera na noite anterior. A memória logo recordou alguns fatos e pessoas da época do “Movimento de Natal”, quando ainda adolescente convivi com o bispo Eugenio Sales, que congregava e motivava a todos, com a sua lucidez e forte liderança. Lá estavam o Dr. Otto de Brito Guerra, cujo centenário de vida é comemorado; Dr. João Wilson Mendes Melo; Artur Vilar; Felipe Neri de Andrade; Ulisses de Góis e tantos outros valorosos soldados do exército de D. Eugenio. No jornal ”A Ordem” despontava a figura ímpar do jornalista Manoel Carlos Chaparro, que a convite de D. Eugenio viera de Portugal, após sofrer perseguição política do ditador Salazar. Ele assumiu a direção da redação e fez verdadeira revolução no jornalismo local. Uma das suas primeiras medidas foi acabar a minha coluna, intitulada “Política nacional”. Em princípio, protestei. Terminei aceitando o conselho para ser um repórter, na busca de “furos”. Em conseqüência, aos 17 anos, ganhei o prêmio Esso regional de reportagem, com a série “a cidade por dentro”, que mostrou Natal por dentro e por fora. Empresário e deputado à época reclamou a D. Eugenio a publicação da foto de sua casa, ao lado de casebres em Mãe Luiza. D. Eugenio sorriu ao me comunicar o ocorrido. Logo depois, ganhei outro prêmio nacional do Ministério da Aeronáutica (“semana da asa”) com reportagem sobre a Base Aérea de Natal, na II Guerra.

    A redação do jornal e da rádio funcionavam em sala improvisada na construção da atual Catedral de Natal, em frente ao SAR (Serviço de Assistência Rural), órgão presidido por D. Eugenio, que executava as ações sociais do “movimento de Natal”. De costume, chegava para redigir o noticiário da Rádio Rural às 7 da noite, ao lado do amigo (já falecido) Marco Antonio Rocha. Certa vez, Marco observou que moças passavam na calçada e uma delas olhava muito para mim. Achei que era impressão dele. Imaginei que aquelas moças teriam gente de muito mais futuro para olhar, do que um repórter trabalhando fora do expediente. Entretanto, Marco tinha razão. A moça era Abigail, com quem estou casado há quarenta e cinco anos. Até no casamento recebi as bênçãos de D. Eugenio. Se não integrasse a sua equipe, jamais teria freqüentado a sofisticada rua Açu, onde se localizava a redação. Aprendi com D. Eugenio lições de respeito humano e fé cristã. Orgulho-me de legar essa herança aos meus filhos e netos.

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    Ney Lopes – Jornalista; advogado, professor
    de direito constitucional e ex-deputado federal.

    Publicado aos domingos nos jornais
    DIÁRIO DE NATAL e GAZETA DO OESTE


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