Marca Maxmeio

De Olho Aberto

  • 05 de Abril de 2008

    Vai ou racha!

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    Continua repercutindo positivamente, em todo o Brasil, a entrevista concedida pelo Senador Garibaldi Alves à revista VEJA, na edição de 02.04.08.

    Sem dúvida, o Presidente do Congresso disse verdades que precisavam ser ditas. Quem acompanha esta coluna sabe que, frequentemente, abordo algumas das mazelas denunciadas pelo Senador potiguar.

    O Congresso Nacional do Brasil atravessa há anos uma gravíssima crise de credibilidade.

    Repito o senador Garibaldi: “o Legislativo não é mais uma voz da sociedade, nem caixa de ressonância. Está meio sem função”.

    Mais adiante declara: “o Parlamento está agonizante e muitos políticos usam o mandato apenas em proveito próprio... A maioria... segue a lógica de votar com o governo, liberar as emendas, emplacar um cargo para um aliado e colher os dividendos nas eleições”.

    Tocando no “calcanhar de Aquiles” do sistema político, eleitoral e partidário brasileiro, o Senador Garibaldi descreveu a triste realidade: “a política hoje é o seguinte: quem já entrou sem dinheiro tenta sobreviver. Mas quem é liso não tem mais vez. Só vão entrar os endinheirados, ou quem está atrás de mais dinheiro”.

    É gravíssimo um parlamentar, no exercício da Presidência do Congresso Nacional, fazer, sobretudo essa última declaração. Além de falar a Verdade, ele assume inarredável compromisso com a busca da alteração – o mais rápido possível – de tal estado caótico da nossa democracia.

    Não tenho a menor dúvida de que, qualquer país democrático começa a abrir espaço para o autoritarismo ou “caciquismo”, quando é enfraquecido o seu sistema representativo.

    Quem estuda teoria geral do Estado sabe que a circulação sanguínea e o coração da democracia encontram-se no mecanismo de escolha e desempenho dos seus representantes.

    A isto se chama “legitimidade democrática”.

    O modelo de democracia da Grécia antiga era exercido por meio da participação dos cidadãos, na chamada democracia direta, onde os membros da comunidade, dotados de cidadania, reuniam-se em assembléia para deliberar sobre os assuntos estatais em pauta.

    Longo período de tempo separa o modelo clássico de democracia da sua versão no mundo moderno.

    Na Idade Média, a noção de representação política não esteve presente nos Conselhos das Monarquias Medievais. Tais Conselhos eram meramente consultivos e não defendiam direitos do povo, mas direitos e prerrogativas das castas e corporações privilegiadas.

    A realidade social foi aos poucos se alterando, ao ponto de tornar inviável a reunião do povo para a tomada direta de decisões coletivas, conforme recomendava a democracia grega.

    A democracia indireta, ou regime representativo originou-se, portanto, na impossibilidade de continuidade da democracia direta, tendo em vista que os Estados passaram a ter territórios mais extensos e populações numerosas. Passou a existir grande complexidade para a gestão da coisa pública, somada à falta de tempo dos cidadãos, absorvidos nos afazeres particulares.

    Surge, então, a “representação popular”. Thomas Hobbes (no “Leviatã”) define o representante (deputado, senador, vereador...) como alguém autorizado para agir, em nome de quem originariamente tem o direito de agir.

    Isto quer dizer: quem tem o direito originário de agir é o cidadão-eleitor. O representante eleito pelo sufrágio universal age e decide em nome dele. Aí está o sistema representativo, diretamente vinculado à eficácia do regime democrático.

    O sistema representativo tem início na Europa. A Inglaterra colocou-se na vanguarda em relação à imposição de limites à excessiva concentração de poderes e competências na pessoa do Rei. Já em 1215 foi promulgada a "Magna Carta", em que o rei João Sem Terra se comprometeu a obedecer aos princípios daquela Constituição (considerada a primeira do mundo), os quais asseguravam direitos e garantias às liberdades individuais dos cidadãos, além de efetiva presença do Parlamento como órgão representativo e deliberativo.

    A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão é outro documento fundamental na evolução do sistema representativo. Lê-se no artigo 3º: "O princípio de toda soberania reside, essencialmente na nação; nenhum indivíduo ou grupo de indivíduos poderá exercer qualquer autoridade que não emane diretamente da nação". Esse princípio evidencia a ruptura ocorrida, pós Revolução Francesa, em relação ao Antigo Regime, representado pela expressão de Luís XIV: "L’État c’est moi" (“O Estado sou eu”).

    Noberto Bobbio conceitua “representação” sob dois aspectos etimológicos. Primeiro, significa “agir em nome e por conta de outrem”. Segundo, “reproduzir, espelhar ou refletir a vontade popular”.

    No Brasil, o sistema representativo foi estabelecido desde a primeira Constituição outorgada, em 1824, por D.Pedro I, a qual previa um governo monárquico, hereditário, constitucional e representativo. Na prática, ocorreu centralização de poder nas mãos do monarca, vez que o rei exercia plenamente o Poder Moderador, que lhe dava superioridade em relação aos demais Poderes

    Verifica-se que quando falha o sistema representativo, também falha a democracia. Um não sobrevive sem o outro.

    A história mostra que a mais vibrante defesa da representação política foi feita por Edmund Burke em seu “Discurso aos Eleitores de Bristol” (1942), quando afirmou: “O Parlamento não é um congresso de embaixadores que defendem interesses distintos e hostis; interesses que cada um de seus membros deve sustentar, como agente e advogado, contra outros agentes e advogados, mas uma assembléia deliberativa de uma nação, com um interesse: o da totalidade, onde o que deve valer não são os interesses e preconceitos locais, mas o bem geral que resulta da razão geral do todo”.

    O Congresso Nacional – segundo o seu Presidente – é palco atual de uma séria crise de legitimidade do nosso sistema representativo.

    Fundamental observar que a iniciativa para mudar esse quadro terá que nascer no próprio Congresso Nacional. O povo está anestesiado pela política assistencialista (bolsa família e cia) e se entrega a uma total apatia, limitando-se a considerar os representantes políticos indivíduos abomináveis, sem nível, entregues às práticas corruptas.

    O Executivo enxovalha todos os dias o Congresso Nacional, com a decretação de medidas provisórias.

    A mídia colabora para que os representantes percam mais espaço diante da opinião pública e não tenham credibilidade para falar em nome do povo.

    Resultado: a imprensa passa a falar em nome da sociedade. Ela substitui, na prática, o sistema representativo. As contínuas desmoralizações de representantes populares, divulgadas nos meios de comunicação significam, no mínimo, o início da verdade, sob o argumento de que “onde há fumaça há fogo”.

    Daí a observação oportuna, do Senador Garibaldi Alves, em sua entrevista: “O Congresso pode desmoronar do jeito que vai”.

    Verdade verdadeira!!!

    Para evitar a catástrofe, somente resta à saída do Senador Garibaldi Alves passar a história do Parlamento, colocando, urgentemente, em pauta a discussão e votação da reforma política, eleitoral e partidária.

    Não há mais tempo a perder!

    A democracia brasileira atingiu o seu limite máximo de risco.

    Agora, “vai ou racha”.

    Coluna semanal
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