Marca Maxmeio

De Olho Aberto

  • 11 de Janeiro de 2008

    Uma coisa ou outra

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    Fico meio tonto e sinto dificuldade em analisar os fatos, quando vejo o Sr. Hugo Chávez, risonho e com a cara de herói, no Palácio Miraflores em Caracas, festejando a libertação pelos guerrilheiros da FARC (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) das reféns colombianas Clara Rojas e Consuelo González. O Presidente venezuelano foi o interlocutor. Para chegar à libertação, ele falou ao telefone com os guerrilheiros, quantas vezes quis. Tudo acompanhado e aplaudido pela quase totalidade da mídia mundial.

    Compreendo que a liberdade das duas reféns provoca justificada satisfação em todos aqueles que têm respeito pela vida e a liberdade humana. Afinal, trata-se de sentimento cristão.

    De outro lado, não vejo possibilidades reais – Deus queira que esteja enganado – de prosperar um diálogo honesto e democrático entre o governo constitucional da Colômbia e o exército guerrilheiro de Manuel Marulanda, 77, fundador e comandante perpétuo da FARC.

    Gabriel García Marques, no seu livro "Cem anos de solidão", aborda o entendimento (pode-se dizer parceria), que ocorreu na Colômbia, no pós II Guerra Mundial. Os liberais – como sempre avançados e defensores de reformas estruturais do Estado – aliaram-se aos então socialistas colombianos. Tornaram-se ferrenhos oposicionistas do governo conservador, que se opunha as necessárias mudanças econômicas e sociais.

    Observe-se que, nessa época, países como o Brasil (com Vargas), Argentina (com Perón) e México (com Cárdena) promoveram reformas que substituíram o liberalismo ortodoxo, defensor do "laissez faire laissez passer", concepção econômica que significava "deixa fazer, deixa, ir, deixa passar". Era a liberdade absoluta e total. Praticamente, eliminava o papel fiscalizador do Estado. Algo absolutamente inconcebível.

    Tais idéias liberais extremadas começaram a cair com o Presidente Roosevelt, no "new deal", o período da grande recessão americana, na década de 1930. O estado passou a intervir na economia. Keynes escreveu um livro clássico, que aborda tais mudanças ("Teoria geral do emprego, do juro e da moeda). Nesse período, o petróleo foi nacionalizado no Brasil e os verdadeiros liberais aprovaram integralmente a decisão. A economia não poderia ficar à mercê do lucro e do mercado, com o Estado distante e acéfalo.

    Após alguns anos de unidade de ação entre a esquerda e os liberais da Colômbia, Fidel Castro chegou ao poder em Cuba no início da década de 60 e passou a ditar "regras" revolucionárias na América Latina.

    A partir daí tornou-se impossível a convivência entre os liberais e a esquerda colombiana. Era o mesmo que tentar juntar azeite com água.

    Em 1964, após violenta repressão no distrito de Marquetália, camponeses revoltosos fogem para a selva e as montanhas. Surge à maior e mais antiga organização guerrilheira das Américas – as "Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC)". Marulanda assumiu o comando até hoje. Ele é conhecido como "tiro certo" e lidera cerca de 50 mil homens, divididos em dezenas de frentes guerrilheiras, distribuídas no território colombiano.

    Vê-se que a tentativa de diálogo democrático acabou nos anos 60. Ao contrário, a FARC a cada dia intensificou massacres, morticínio em massa nas aldeias e povoados. O mais grave é a união aberta e clara com narcotraficantes, como forma de angariar recursos.

    Em relação ao Brasil, basta recordar a morte de Tomás Medinas Caracas, conhecido como Negro Acácio, comandante da FARC e influente traficante. Ele era sócio do brasileiro Fernandinho Beira Mar.

    Além da FARC, surgiram na Colômbia outros grupos revolucionários marxistas como o Exército de Libertação Nacional, criado por Che Guevara, com apoio de Cuba.

    Muito endeusado por grupos sectários de esquerda, que o consideram um humanista, a história registra de outra forma o perfil de Che Guevara.

    Ele aprovou pessoalmente centenas de execuções sumárias pelo tribunal revolucionário de Havana. Comandou a "Fortaleza de San Carlos de La Cabana" onde só nos primeiros dias da Revolução Cubana ocorreram dezenas de fuzilamentos, sem defesa.

    O próprio Guevara escreveu: "as execuções são uma necessidade para o povo de Cuba". Os "campos de trabalho coletivo" - semelhantes aos campos de concentração – foram criados por Che, que proclamava de alto e bom som acreditar e estimular a luta armada como única alternativa social.

    A Colômbia de hoje tem 40% do seu território ocupado por essas forças de guerrilha. A tradição é de rigidez ideológica e praticamente nenhum precedente de diálogo, consenso e acordo. Na época em que governou a Colômbia o Presidente Pestana – que conheci pessoalmente no Parlatino – foram tentadas saídas negociadas para a libertação de presos. Em todas elas, a guerrilha prometeu uma coisa e fez outra.

    Agora mesmo, a guerrilha anunciou na época do Natal, a libertação do garoto Emmanuel, o qual já estava em liberdade na Colômbia. Apenas, jogo de cena para angariar prestígio internacional.

    Sou favorável que sejam feitos todos os esforços para novas libertações de reféns, intermediados pelo Presidente Chávez, em contato com a guerrilha. Mas, tudo tem limite. O Estado democrático, livre e constitucional não pode igualar-se, nem submeter-se às ameaças de grupos clandestinos e fora da lei.

    Se for encontrado um meio termo, em que prevaleça a intenção de libertar seres humanos em cativeiro, tudo bem. Porém, se as exigências forem além de tais limites e imponham a desmoralização do Estado colombiano será, com certeza, impossível aceitá-las.

    A opinião pública precisa estar bem esclarecida para não reagir emocionalmente. Não se pode condenar o Presidente Uribe da Colômbia, se ele exigir condições de legalidade nesse diálogo com a guerrilha.

    O mundo deve alegrar-se. Mas a alegria de cidadãos bem intencionados e felizes com a libertação de seres humanos, não poderá assemelhar-se aos festejos do "ano novo" no famoso filme "Poseidon". Naquele navio ergueram-se brindes, porém o futuro chegou mais rápido do que os passageiros imaginaram. Uma enorme onda acerta a lateral do transatlântico e leva a embarcação ao naufrágio. Todos que pareciam seguros e felizes, passaram a lutar pela sobrevivência.

    No episódio da Colômbia, a luta poderá ser pela sobrevivência democrática, ante os riscos iminentes de um naufrágio político, caso se invertam os papéis no diálogo internacional.

    Por mais que se deseje a libertação de inocentes, a existência de uma "armadilha" por trás disso provocará "naufrágio político", com destroços que agravarão a situação não apenas da Colômbia, mas de toda América Latina.

    Não se fale em gesto humanitário da FARC. Quem seqüestra inocente não tem em seu dicionário a palavra "humanitária". Admitamos, no máximo, gesto político, talvez para fortalecer o Presidente Hugo Chávez.

    Jamais nenhum tipo de heroísmo poderá ser identificado nas libertações da última quinta feira.

    O que se pode esperar como busca da Paz é que a FARC canse da clandestinidade e acene com gestos de entendimento e libertação dos seqüestrados.

    Nessa hipótese cabe usar-se a palavra clemência e até anistia. Porque, na história do mundo existem precedentes de "passar a borracha" para a busca de um mundo melhor e mais pacífico.

    Para que isso ocorra, o comandante Manuel Marulanda precisa mudar a linguagem que usou no último dia 3 de janeiro, quando recomendou ao povo colombiano massacres, saques, convivência com o narcotráfico, exigências de 10% de imposto sobre quem ganhe mais de um milhão de dólares e outras ações.

    Se continuar esse discurso típico da guerrilha será muito difícil a Paz. A não ser que a Colômbia se entregue de corpo e alma a FARC e deponha o seu governo democrático e constitucional.

    Tudo porque, será impossível existir "democracia guerrilheira", ou "guerrilha democrática". Tem que ser uma coisa ou outra.

    Eis a difícil questão. (Seu Comentário)

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