Brasília em Dia
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10 de Julho de 2010
Ficha limpa e pena de morte
“STF revoga a lei da ficha limpa”.
Esta e outras manchetes propagaram-se pelo Brasil nos últimos dias, após as decisões de dois eminentes ministros do STF suspendendo – leia-se: apenas suspendendo – os efeitos de condenações impostas a candidatos. Os despachos judiciais tiveram duas justificativas básicas: tramitavam recursos, em fase de julgamento: e o risco iminente da perda do prazo para o registro eleitoral no dia 5 de julho (preclusão eleitoral), em função do semestre judiciário ter terminado em 29 de junho, com o período de férias forenses iniciado em 2 de julho de 2010.
Lembro aos que confundem o dever com a virtude, que nesta coluna defendi a constitucionalidade da lei da ficha limpa (LC 135/19) e a sua eficácia imediata em 2010. Não há nenhuma virtude nesta posição pessoal. Apenas, o dever de lutar pela moralidade das eleições brasileiras, infelizmente infectadas pela omissão do Congresso Nacional em ter aprovado uma reforma política, eleitoral e partidária.
Comete-se grave injustiça com o STF, ao atribuir-lhe a revogação da lei da ficha limpa. Definitivamente, isto jamais ocorreu. O juiz não faz a lei. Cabe a ele aplicá-la. O artigo 26 da nova lei normatiza que as condenações existentes e em processo de julgamento de recursos, poderão ser suspensas, desde que examinadas – caso a caso – as razões do direito invocado. Suspender não é a mesma coisa de absolver, ou revogar. Apenas, deixa de ser aplicada temporariamente a inelegibilidade do candidato, sujeitando-o futuramente ao cancelamento do registro e até a cassação do mandato, se mantida a sentença condenatória. E mais: conferido o efeito suspensivo, o julgamento do recurso terá prioridade sobre todos os demais, à exceção dos de mandado de segurança e de habeas corpus.
Cabe observar alguns detalhes fundamentais deste primeiro caso de pedido de suspensão, que tramita na 2ª Turma do STF. Já se iniciou o julgamento, com o voto favorável do relator e um voto contrário, baseado no entendimento de não ser possível reexaminar, em sede de recurso extraordinário, as provas do processo. Nota-se que o mérito não foi apreciado, mas sim o aspecto processual de validar ou não as provas existentes nos autos. O parecer do relator enfatiza vários precedentes da jurisprudência, que consagram a diferença entre “reexaminar a prova” e “validar a prova dos autos”. Entre tais precedentes, inclui-se o RE 99.590, no qual o então Ministro Moreira Alves entendeu que a valoração da prova não equivale a reexaminar a prova.
Afinal, a aplicação da lei da ficha limpa pressupõe obediência às regras do devido processo legal. Mesmo tendo objetivo de preservar a ética política, ela não poderá instituir o julgamento sumário, ao arrepio dos princípios gerais de direito. Quando se levantou no debate legislativo a presunção da inocência, sempre lembrei ser a tradição do STF não antecipar os efeitos da culpa em matéria penal e, ao mesmo tempo, considerar em julgados que a inelegibilidade eleitoral não é penalidade. Em conseqüência, a nova lei não caracterizaria o cumprimento antecipado de penalidade. O inelegível continua cidadão, na plenitude dos seus direitos políticos. Retira-se, apenas, a possibilidade de se eleger, em alguns casos. A exigência é muito mais cautelosa, do que a restrição em concursos públicos, consumada por uma banca, sem o crivo de juízes togados. Cabe recordar, que a exigência do exame da vida pregressa dos candidatos está inserida no artigo 14 § 9° da Constituição de 1988. Será que a Lei maior ao falar de “vida pregressa” seria inútil, inconseqüente e vazia?
Em matéria de ficha limpa, “nem tanto ao mar, nem tanto ao peixe”. Seria absurdo e ilógico vedar por antecipação o registro de candidaturas – mesmo existindo condenações em colegiados - com recursos pendentes em instancias superiores. A prevalecer tal entendimento, se consagraria o equívoco de aplicação antecipada e definitiva da inelegibilidade do candidato.
Não há dúvida que o STF interpreta corretamente a LC 135/10. Faz mal a democracia, a tentativa de enxovalhar a Corte Suprema e seus ministros, com insinuações de suposta conivência com práticas de corrupção eleitoral. Ninguém é obrigado a conhecer direito e jurisprudência. Entretanto, até por este motivo, não deve difundir na opinião pública a idéia de que a lei da ficha limpa seja a pena de morte eleitoral. Tal entendimento seria reeditar, em pleno século XXI, os julgamentos sumários e autoritários do AI-5, de triste memória.
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