Brasília em Dia
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11 de Janeiro de 2008
Sigilo bancário
Concordo em gênero, número e grau com a opinião do Eminente Ministro Marco Aurélio Mello do STF, acerca da flagrante inconstitucionalidade e ilegalidade da recente instrução normativa do Governo Federal, que obriga o envio pelos bancos de informes à Receita Federal das movimentações de pessoas físicas e jurídicas.
Sobre esse assunto do “sigilo bancário” e os debates legislativos anteriores à sanção da atual LC 105/01, que dispõe sobre o sigilo das operações de instituições financeiras, posso dizer como o poeta Gonçalves Dias, na “Canção do Exílio”: “meninos eu vi”.
Fui o relator no ano 2000, na Câmara dos Deputados, do projeto de Lei Complementar n° 220/98, de autoria do Senador Lúcio Alcântara. Após subscrever o parecer vitorioso na Comissão de Constituição e Justiça enfrentei acirrados debates em plenário (ocupei a tribuna cinco vezes, na sessão final de votação), em defesa do substitutivo.
Contrariamente a orientação política do Governo FHC (a cuja base política pertencia) defendi a tese de inconstitucionalidade e injuridicidade do artigo 4°, que permitia a quebra do sigilo bancário (dados e documentos sigilosos), sem a autorização do Poder Judiciário, atribuída tal competência às Receitas federal, estadual e municipal (!!!!). Lembrei que a Constituição vigente assegura a inviolabilidade do sigilo de “dados” e excepciona exclusivamente as “comunicações telefônicas”, com ordem judicial. Nos direitos e garantias fundamentais, a privacidade está também garantida nos princípios insertos nos incisos X, XI, XII, LIV e LV, do artigo 5°.
Valeu a luta. Os deputados acataram o chamado “substitutivo Ney Lopes (PFL-RN)”, que garantiu a necessidade de autorização judicial para quebra do sigilo bancário no país. Tive o apoio do PT, PcdoB e partidos de esquerda.
No Senado Federal, de forma inusitada, o então líder do governo, Senador José Roberto Arruda (PSDB-DF), comandou reação contrária à decisão da Câmara dos Deputados para modificar radicalmente a essência do meu substitutivo.
O Senado derrotou o substitutivo da Câmara e deu origem a atual LC 105/01. O curioso - e inexplicável – foi a manobra regimental à época, que impediu a matéria voltar à Câmara, por ter sido alterada no Senado (!!!). Seguiu direto para a sanção.
Declarei à imprensa que se tratava de um “desrespeito ao cidadão e que hoje seria a quebra do sigilo. Amanhã seria a invasão de domicílio”. O prognóstico vem se confirmando, na realidade brasileira atual.
Guardo como troféu, o depoimento do líder do Governo de então, deputado Arnaldo Madeira, de que o governador Mario Covas – de saudosa memória –antes de internar-se para a cirurgia, disse a ele: “aprovem o substitutivo do Ney Lopes sobre sigilo bancário, que é o melhor caminho”.
Nos debates no ano 2000 tentou-se colocar o legislativo num “beco sem saída”. Se negasse, estaria defendendo bandidos, crimes do “colarinho branco” etc. Se aprovasse feriria o direito fundamental do cidadão à privacidade e o compromisso com as liberdades humanas.
O substitutivo que subscrevi mantinha a competência do Congresso quebrar o sigilo bancário (plenário ou CPI), independente de ordem judicial. Assegurava ao cidadão o mínimo de garantia, ao propor o prazo decadencial de 72 horas para o juiz, em rito sumário, apreciar o pedido da quebra. O texto do substitutivo excluía da autorização judicial aquelas situações em que fosse evidente a necessidade de combate a sonegação e à criminalidade.
Oportuno lembrar que nos EEUU – exemplo de democracia – a Receita somente tem acesso aos dados do contribuinte com anuência deste. Diante de recusa, é proposta ação judicial, até o vigésimo dia, contado a partir da recusa, para que seja permitido o acesso aos dados bancários, assegurada ampla defesa ao contribuinte.
Continuo a considerar inconcebível o aparelho estatal mover-se às costas do cidadão, a quem cumpre promover segurança e bem estar. É inadmissível que diante de meros indícios de sonegação a Receita Federal, de moto próprio, acumulando as funções de credora, órgão investigador, promotor e juiz, rastreie as contas bancárias, sem ordem judicial, sem autorização do contribuinte, sem ao menos dar conhecimento do objeto da investigação fiscal.
E o mais grave. Poder fazer tudo isto, apenas como uma “birra”, após a CPMF não ter sido prorrogada. Inacreditável. Só resta a palavra final do STF.
Ou, de um remedinho legislativo restabelecido na Constituição de 1988, que é o decreto legislativo autorizado no art. 49, V, usado para sustar os atos normativos do Executivo, que exorbitem o poder regulamentar.
Se a última instrução normativa da Receita Federal não for exorbitante, melhor seria retirar do texto constitucional a figura do decreto legislativo... (Seu Comentário)Coluna semanal
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