Brasília em Dia
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22 de Junho de 2007
O voto em lista
O calcanhar de Aquiles da reforma política em discussão no Congresso Nacional é a exagerada autonomia dos partidos políticos, outorgada pela Constituição de 1988 (art. 17 § 1°). O Partido político hoje no Brasil pode tudo. A sua estrutura interna, organização, funcionamento, normas de fidelidade e disciplina é definida no Estatuto. Um militante partidário está impedido de recorrer ao Judiciário em matéria considerada interna corporis, caso sofra lesão ou ameaça de direito, o que, aliás, conflita com a garantia constitucional do artigo 5°, inciso XXXV.
Como será possível adotar a lista partidária com a manutenção dessa garantia constitucional? Inexistindo alteração constitucional ao princípio da “autonomia dos partidos”, os que se opõem à lista fechada terão razão total e absoluta. As convenções “a bico de pena” continuarão escolhendo de véspera – em verdadeiras listas fechadas - os seus preferidos para a disputa dos mandatos. Na prática, consolidaria a decisão imperial das cúpulas partidárias, com maior gravidade do que já ocorre.
Cabe deixar claro que sou favorável a autonomia dos Partidos. Jamais defenderia torná-los “autarquias” ou “órgãos semi-estatais”. Entretanto, deve ser preservada a segurança jurídica dos militantes para que todos os atos partidários – quaisquer que sejam – possam ser submetidos ao Poder Judiciário, inclusive a forma de aplicação do Fundo Partidário.
A solução – que deveria estar na pauta da reforma política - seria através de emenda constitucional, condicionar a “autonomia dos partidos” a uma lei complementar regulamentadora, que não excluiria do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito de qualquer natureza aos militantes. Isto significará a abertura da porta para o voto em “lista fechada”, sistema adotado pela Bélgica em 1899, que é realmente nas democracias modernas, a única forma de reduzir as tensões e a corrupção desenfreada no processo eleitoral. Continuariam a existir falhas. Com certeza, em menor proporção do que hoje, quando o maior inimigo de quem disputa uma eleição proporcional é o seu próprio companheiro de partido.
A eleição proporcional nominal, em listas abertas, como é atualmente no Brasil – isto ocorreria também no voto distrital- estimula a vulgarização dos debates políticos e os grandes temas nacionais ou regionais são substituídos pela troca do favor pessoal, assistencialismo e reivindicações menores. Os eleitos nada mais são do que meros despachantes, mendigando verbas e favores nos órgãos do Executivo.
Por outro lado, o financiamento público de campanha e a fidelidade partidária somente terão sentido, se a eleição proporcional for por “lista fechada” e proibida a coligação. Cada partido terá que andar com os seus próprios pés. Não pode continuar como está. Fica até difícil separar o joio do trigo.
Falso – para não dizer insustentável – o argumento de que as “listas fechadas” fortalecem as oligarquias e “donos de partidos”. Isto ocorrerá, caso a reforma seja uma “meia sola”. Para evitar isto, ela terá que começar pela “democratização interna dos partidos”, que não existe hoje, nem existirá depois, na hipótese de continuar a “autonomia” prevista no art. 17 § 1° da Constituição.
Um dos objetivos do voto em lista fechada é estimular à redução de partidos-nunca a extinção dos pequenos dos partidos. Uma espécie de cláusula de barreira, na prática. Cada Partido isolado, ou através de fusões, intensificaria a militância e divulgaria as suas propostas e programas. Que mal haveria nisto? Será por acaso saudável o mercado persa da venda de legendas e de horário eleitoral que existe atualmente? Logo, não há que se alegar o multipartidarismo atual, que realmente teria os seus dias contados.
A lista aproximará o eleitor do eleito, na medida em que a identificação com as idéias e compromissos do partido será mais importante para o país do que o “assistencialismo”, ou a “demagogia” atuais, onde as “ajudas” paternalistas diretas se repetem como incentivos permanentes às praticas de corrupção. Qualquer pesquisa mostra que o eleitor nem se lembra em quem votou na eleição proporcional. Mas, se a decepção for com o partido, ele se lembrará, cobrará e mudará na eleição seguinte.
Quanto à influência das cúpulas e “caciques” poderá até continuar a existir, o que não é novidade hoje em dia. Porém, se houver a democratização partidária interna, através do estímulo à militância, ao debate e a transparência, tal influência será em proporção muito mais reduzida. Leve-se em conta que os partidos serão obrigados a incluir nomes expressivos nas listas, sob pena de perderem a eleição.
O voto em lista fechada tem o aval da história política das democracias atuais. O Brasil jamais ter adotado não é trunfo. Ao contrário, prova de atraso. Somos uma das pouquíssimas exceções no mundo em sistema de votação proporcional nominal.
Será que a maioria dos países está errada e o nosso país certo?
Tudo dependerá da reforma ser aprovada, pensando nas gerações futuras e não apenas na renovação dos mandatos atuais, como parece ser, infelizmente, a preocupação até o momento.Coluna semanal
Revista Brasilia em Dia
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