Brasília em Dia
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15 de Junho de 2007
CPI e 'pílulas milagrosas'
A história se repete. Como em legislaturas passadas, o atual Congresso Nacional gira em torno de instalações de Comissões Parlamentares de Inquérito. E a pergunta inicial continua sendo sempre a mesma: “terminará ou não em pizza?”
Não há como negar que a função básica do Legislativo é o controle político dos atos praticados pelo Executivo, através da fiscalização e análise da gestão pública. Para o exercício de tais funções, o Legislativo haverá de modernizar-se. Se não o faz corre o risco de vulgarização de institutos como o da investigação parlamentar. Cada CPI inconclusa, ou frustrada destrói a imagem do Parlamento.
Participei de várias CPI´s ao longo de mais de duas décadas. A maioria como relator. Em todas elas presenciei verdadeiras “explosões de expectativas”, ante o desejo coletivo de imediata punição dos culpados.
Basicamente, existem dois tipos de distorção das reais finalidades de uma CPI. A primeira delas pode-se denominar de “operação Casablanca” numa lembrança ao clássico filme que consagrou a frase “prendam-se os suspeitos de sempre”. Na “operação Casablanca” jogam-se algemas nos pulsos de alguém de notoriedade e o noticiário cumpre o seu papel de levar sangue para a choldra. Outra forma de uma CPI nada fazer – mas aparecer como muito eficiente - é inventar alternativas estúpidas e paliativas. Chama-se isso de “operação tiro certeiro” e consiste na criação de um factóide qualquer e responsabilizá-lo, às vezes sem o pleno exercício do direito de defesa. Os próprios investigados e o Governo criam tais “factóides” e desviam a atenção coletiva. Atualmente, temos exemplos notórios. Só não entende, quem não queira...
Embora a CPI seja típica do sistema parlamentarista, tendo sido adotada ao longo da história nas monarquias e repúblicas parlamentaristas da Europa e do mundo, cresce a sua importância no regime presidencialista. No Brasil, a Constituição de 1824 não a mencionou. A Constituição de 1891 igualmente silenciou. A partir da Constituição de 1934 a investigação parlamentar passou a integrar o nosso sistema constitucional, logo omitida na Constituição de 1937 (Estado Novo). De 1946 em diante fez parte de todos os nossos textos constitucionais.
Atualmente, as Comissões Parlamentares de Inquérito regem-se pelo art. 58 da Constituição, regimentos internos da Câmara e do Senado e uma superada legislação de 1952 (a lei nº 1.579, de 18 de março de 1952), recepcionada em nossa Carta Magna. Os tempos atuais são outros e vale lembrar Fernando Pessoa, quando escreveu: “Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já têm a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia: e se não ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos.”
A CPI no Congresso Nacional precisa fazer a “travessia” e atualizar-se, através de novas regras de funcionamento. A sua finalidade é investigar “fato determinado, por prazo certo”. Para atingir as suas finalidades terá que ter atribuições legais mais amplas, inclusive “cobrar” e “pedir explicações”, acerca das providências sugeridas no seu relatório final e as propostas de novas leis serem votadas em “urgência urgentíssima” e não ficarem nos arquivos como hoje.
Em absoluto se cogita que as comissões parlamentares de inquérito detenham os mesmos poderes de investigação judicial dos magistrados, ou lesionem o princípio da separação dos poderes. A ampliação de competência apóia-se na concepção dos freios e contrapesos. Segundo Montesquieu, somente o poder será capaz de limitar o poder: “le pouvoir arrête le pouvoir”. O "objetivo do inquérito parlamentar é recolher informações para uma futura legislação ou exercer o controle dos atos da administração pública, remetendo as suas conclusões para que a Justiça e o Ministério Público ajuízem a competente ação - civil ou penal - contra os culpados, quando for o caso".
Atualizar o funcionamento da investigação parlamentar é tarefa inadiável do Congresso Nacional. As origens da CPI na Inglaterra não significaram apenas investigações para punir, mas também trabalho parlamentar de caráter construtivo, ou seja, a tarefa do inquérito sugere a punição dos responsáveis e o recolhimento de informações para futura legislação ágil e eficiente.
Dar uma nova fisionomia às CPI’s no país significará descaracterizá-las como “pílulas milagrosas”, que funcionam a base de maniqueísmos enganosos e verdadeiros arsenais de fumaça, servindo mais para alimentar os holofotes do que a compreensão, solução dos problemas e condenação dos culpados.
Em uma das vezes que fui relator de CPI no Congresso Nacional destaquei, no relatório final, a importância da investigação parlamentar. Resumi a sua finalidade no pensamento de Lessing: “se Deus tivesse em uma das mãos a Verdade e na outra a aspiração da Verdade, eu escolheria esta última”.Revista Brasília em Dia
Data de Publicação: 16 de junho de 2007
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