Marca Maxmeio

Brasília em Dia

  • 05 de Fevereiro de 2011

    O dia seguinte no Egito

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    Até a conclusão deste artigo, nem o Museu do Egito havia escapado da fúria popular, que exige a saída do presidente Hosni Mubarak, no poder há 30 anos. A instituição foi invadida e foram destruídas algumas das mais de duas milhões de peças arqueológicas, a maior coleção mundial relacionada ao Egito.

    A rebelião nos países árabes começou em 17 de dezembro de 2010, quando o tunisiano Mohamed Bouazizi, de 26 anos, envolveu o corpo com solvente e se imolou na Tunísia. Ele era um ambulante que teve a sua banca de frutas confiscada pelo governo do ditador Zine El Abidine Ben Ali, deposto 27 dias depois. Pela primeira vez na história do mundo árabe, um governo ditatorial era derrubado por rebelião popular. O ditador tunisiano estava no poder há 23 anos. Tinha pleno apoio da França e dos EUA, que consideravam o país exemplo para as demais nações do Oriente Médio.

    A Tunísia deu o “pontapé inicial” na rebeldia árabe. Seguiram-se movimentos semelhantes no Egito (onde 35% de sua população está abaixo da linha nacional de pobreza) e no Iêmen (que contabiliza 59% de assolados pela miséria), além do início de insurreições na Argélia (por repúdio da população à reeleição de Abdullah Saleh, no poder há 30 anos) e na Jordânia (revolta contra o aumento nos preços dos alimentos). As populações alegam falta de oportunidades, cuja causa atribuída é o controle oligárquico da política e da economia. A chamada “Liga Árabe” é composta de 22 países. Dez estão na África: Argélia, Djibouti, Egito, Ilhas Comores, Líbia, Marrocos, Mauritânia, Somália, Sudão e Tunísia. Doze se encontram na Ásia: Arábia Saudita, Barein, Catar, Emirados Árabes Unidos, Iêmen, Iraque, Jordânia, Kuweit, Líbano, Omã, Palestina e Síria.

    O Egito lidera o mundo árabe. Daí a sua importância estratégica, sobretudo para os EUA. O país mantém relações diplomáticas (mesmo tensas) com Israel e as facções palestinas rivais (Hamas e Fatah). Na repressão ao terrorismo, o ditador Hosni Mubarak sempre colaborou com os EUA na perseguição contra a rede Al-Qaeda, cujo número dois é o egípcio Ayman al-Zawahiri. O Egito vive há 30 anos sob lei de emergência, que suspende direitos civis. O golpe de 1952 derrubou a monarquia. Todos os quatro presidentes que se seguiram foram generais militares. O Exército – o 10º maior do mundo – exerce o poder de “guardião da revolução”, sendo amplamente popular. Mubarak comandou a Força Aérea antes de chegar ao poder, quando o presidente Anwar Sadat o nomeou vice-presidente, em 1975.

    O Egito de hoje compara-se a um filete de fogo próximo a um barril de pólvora. Há quem veja na rebeldia o “despertar da onda islâmica”, que favoreceria o Irã, rival regional próximo. Outros afastam a motivação religiosa e interpretam os fatos como protestos generalizados contra a falta de oportunidades para os jovens e a liberdade cerceada. A maior dificuldade é dos EUA, que favorecem o Egito com ajuda militar de US$ 1,3 bilhão ao ano. Não se sabe o alcance do discurso do presidente Barack Obama, ao discordar da divisão do mundo árabe em monarquias absolutistas e ditaduras seculares. Apenas Líbano e Iraque têm frágeis democracias. O risco de que a Casa Branca se afaste de Mubarak poderá ser o “efeito bumerangue”, com o surgimento de governo hostil aos EUA, ainda que democrático.

    O dilema de Obama aumenta, se lembrado o episódio de 1978. Na época, o presidente democrata Jimmy Carter optou por não apoiar o então aliado no Oriente Médio, Mohammad Reza Pahlevi, xá do Irã. Carter acreditou que, com a queda do xá, um governo moderado tomaria o poder. O resultado foi a revolução dos aiatolás. Um ano depois – em quatro de outubro de 1979 –, ocorreu a invasão da embaixada americana em Teerã, ocasião em que 53 cidadãos americanos foram tomados como reféns. O cativeiro durou 444 dias.

    O egípcio Mohamed ElBaradei, Prêmio Nobel da Paz de 2005, conduz o diálogo com o governo, o que descaracteriza a vinculação dos insurretos ao islamismo ortodoxo. Na verdade, a insatisfação popular associa-se à alta do custo de vida, aos salários reduzidos, aos abusos de poder, ao enriquecimento de poucos, à falta de liberdade e dignidade de direitos humanos. A dúvida será o “day after” no Egito, caso a situação se torne incontrolável. O precedente ocorrido na República Teocrática do Irã em 2009, durante os protestos por suposta fraude eleitoral, comprova que a ação repressiva do governo não esfria o caldeirão. A chaleira continuará a ferver aos gorgolhões, e a tampa poderá espocar a qualquer momento.

    Coluna semanal
    Revista Brasilia em Dia

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