Brasília em Dia
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14 de Fevereiro de 2009
Herança no Congresso
No primeiro momento, a herança mais delicada dos presidentes senador José Sarney e deputado Michel Temer será a regulamentação das medidas provisórias.
As MPs foram introduzidas na Constituição de 1988 por influência da Itália. A redação do artigo 77 da Constituição é praticamente transcrita em nossa Carta Magna. Senão, vejamos: “Art. 77- O governo não pode, sem delegação das Câmaras, promulgar decretos que tenham valor de lei ordinária. Nos casos extraordinários de necessidade e de urgência, o governo poderá adotar, sob sua responsabilidade, medidas provisórias com força de lei. Deve, contudo, apresentá-las no mesmo dia para apreciação das Câmaras que, mesmo dissolvidas, são convocadas e devem reunir-se dentro de cinco dias. Os decretos perdem o seu poder legal desde o início se não convertidos em lei no prazo de sessenta dias a partir da sua publicação. As Câmaras podem, contudo, regulamentar com lei as relações jurídicas surgidas na base dos decretos não convertidos em lei”.
A grande diferença entre os dois países é que o instituto constitucional italiano aplica-se numa forma de governo parlamentarista. No presidencialismo brasileiro, a MP outorga mais poderes ao Executivo, que historicamente tem exorbitado no uso da prerrogativa legislativa.
Os revolucionários franceses pregavam o fortalecimento do poder legislativo e atribuíam “ao Corpo Legislativo o exercício pleno e inteiro do poder legislativo. Ao conselho executivo é expressamente proibido modificar, ampliar, ou interpretar as disposições das leis e dos decretos [legislativos] seja sob que pretexto for”.
O direito constitucional comparado constata que uma das formas do Executivo enfrentar situações de emergência é o uso da chamada “delegação legislativa”. A tradição republicana brasileira inseriu tal hipótese na experiência parlamentarista da década de 60, nas Constituições de 1967 e na atual. Infelizmente, essa alternativa legislativa quase não foi usada. Encontram-se apenas duas leis delegadas, na época do presidente Fernando Collor de Melo. No Brasil tem prevalecido a intervenção freqüente do Executivo no Legislativo, através dos decretos-lei, atualmente travestidos de medida provisória.
Na prática, o Congresso Nacional se transformou em mais uma “repartição pública” vinculada ao executivo. Até na Emenda Constitucional 32/2001, que alterou a tramitação das MPs, usou-se a via legislativa excepcional 2.230 vezes, sem contar as reedições. Posteriormente, foram editadas cerca de 480 MPs. Os números comprovam que a MP, ao invés de aplicação esporádica, se transformou desde 1988 em “campeã” das leis aprovadas no Congresso. Também no pódio, como vice-campeões, os projetos de lei originários do Executivo. Uma lástima!
Note-se o exemplo dos Estados Unidos na votação do recente “pacote” econômico do governo Obama. Mesmo diante da indiscutível urgência, a Câmara rejeitou a proposta, obrigando alterações de última hora. Depois, o Senado reduziu o volume de recursos, tudo através de intensa negociação.
Somente em casos de evidente relevância o presidente americano solicita ao Congresso poderes especiais para outorgar medidas legislativas urgentes. Bush pediu no fast track (via rápida) para apressar a aprovação da Área de Livre Comércio das Américas (Alca). Nos países europeus, tais mecanismos de urgência legislativa são usados com parcimônia refletindo sempre posições partidárias, e não apenas do Executivo.
Ao contrário, o governo brasileiro, a partir de 6 de outubro de 2008, desancou em editar medidas provisórias (a primeira foi 442/08) a pretexto de combate à crise econômica mundial. Nesse ritmo, em curto período, já chegamos à última - MP 453 -, editada em 22.01.09.
Muitas propostas de regulamentação das MPs estão em cima da mesa. Uma das mais sensatas é a que admite o “juízo de admissibilidade” prévio de uma Comissão Mista do Congresso Nacional, que examinaria a constitucionalidade da MP e se ela preencheria os requisitos de urgência e relevância. A utilização de tal regra de procedimento legislativo faria com que o edito executivo somente tivesse vigência após o pronunciamento inicial do legislativo.
Certamente, a cautela amenizaria muito os efeitos drásticos das medidas provisórias no direito brasileiro.Coluna semanal
Revista Brasilia em Dia
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