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Palestras

  • 18 de Setembro de 2001

    A BIODIVERSIDADE COMO ESTRATÉGIA MODERNA

           A busca do desenvolvimento regional é um velho sonho que faz parte da mística nacional de todo brasileiro.  Ao longo de séculos, o conceito de desenvolvimento para a região evoluiu da simples ocupação e do extrativismo básico para a exploração grosseira e desordenada dos produtos da floresta, culminando com a aplicação de tecnologias industriais modernas no desmatamento agro-pecuário e madeireiro.  Lado a lado com as queimadas, provocadas e espontâneas, que devastam grandes áreas de cobertura vegetal nos meses secos, aquelas ações antrópicas são responsáveis pelo encolhimento progressivo da maior floresta úmida do planeta, que abriga um percentual impressionante da diversidade biológica conhecida e porcentagem ainda maior das reservas hídricas, cada vez mais preciosas para a subsistência do Homem na terra.

    Instituto Nacional de Altos Estudos

    FORUM NACIONAL

    Seminário Especial sobre
    A BIODIVERSIDADE COMO ESTRATÉGIA MODERNA
    DE DESENVOLVIMENTO DA AMAZÔNIA

    Local: BNDES (Rio de Janeiro, RJ – Brasil)
    18 de setembro de 2001

    Exposição do DEPUTADO NEY LOPES (PFL-RN) – relator no Congresso Nacional da Medida Provisória  que regula o acesso às riquezas biológicas em todo o país.

    “Regulação do acesso ao patrimônio genético como marco na utilização sustentável da biodiversidade para o desenvolvimento da Amazônia”.

    A busca do desenvolvimento regional é um velho sonho que faz parte da mística nacional de todo brasileiro.  Ao longo de séculos, o conceito de desenvolvimento para a região evoluiu da simples ocupação e do extrativismo básico para a exploração grosseira e desordenada dos produtos da floresta, culminando com a aplicação de tecnologias industriais modernas no desmatamento agro-pecuário e madeireiro.  Lado a lado com as queimadas, provocadas e espontâneas, que devastam grandes áreas de cobertura vegetal nos meses secos, aquelas ações antrópicas são responsáveis pelo encolhimento progressivo da maior floresta úmida do planeta, que abriga um percentual impressionante da diversidade biológica conhecida e porcentagem ainda maior das reservas hídricas, cada vez mais preciosas para a subsistência do Homem na terra. 

    Deixada à própria sorte, a Floresta Amazônica tenderá ao mesmo fim das florestas dos países desenvolvidos, exemplificada entre nós pela dramática redução de área da Mata Atlântica nos últimos quinhentos anos.  É óbvio, portanto, que a proposta de desenvolver a Amazônia há que ser entendida como um conjunto coordenado de ações sócio-econômicas e culturais, que resulte no respeito que conserva nossa riqueza biológica, ao mesmo tempo em que promova a integração amazônica, através de processo de desenvolvimento sustentado, apoiado no que melhor podem oferecer Ciência e Técnica à exploração racional das riquezas da floresta.  Para isso, é necessário montar a longa cadeia de agregação de valor, que vai da floresta aos mercados mundiais de alta tecnologia. É necessário garantir que essa complexa operação tenha um crescente componente de retorno de benefícios para a região. Igualmente essencial integrar o Amazônia não só na base do processo, mas ao longo de todos os seus estágios, até os mais avançados e próximos dos mercados finais. Embutida nessa receita, aparentemente simples, está um desafio de grande complexidade: gerar progresso econômico e social, aumentar a ocupação racional sem devastar, e, principalmente, promover a integração cultural de comunidades locais e indígenas ao processo, sem desfigura-las nas suas tradições e sem perder o muito que podem adicionar às civilizações ditas avançadas, pelo seu conhecimento e pelas suas práticas ajustadas a uma existência de equilíbrio com o seu meio ambiente.

    Em termos institucionais e normativos pode-se erigir a Convenção sobre Diversidade Biológica, de 1992, como o marco para as novas abordagens políticas e econômicas desse tema. A Convenção motivou numerosas atividades públicas, individuais e coletivas em relação à diversidade biológica, erigido como tema de preocupação central da humanidade a partir de então.

    Ela determina que a diversidade biológica, além de preocupação comum (common concern) da humanidade, é patrimônio de cada país onde ocorre, sendo seu uso (acesso) sujeito à sua legislação. Em complemento, e de maneira aqui simplificada, prevê que os países detentores de tecnologia, inclusive biotecnologia, a transfiram para os países pobres e em desenvolvimento (ricos em biodiversidade e carentes de recursos financeiros e tecnológicos), num processo em que se respeite os direitos de propriedade intelectual sobre as tecnologias envolvidas.

    A partir daí foi desencadeado todo o procedimento de criação de legislações nacionais sobre o tema. Costa Rica, Filipinas, Colômbia, Brasil e vários outros, a partir da entrada em vigor da Convenção, em dezembro de 1993, iniciaram amplo debate para a instituição desse novo código de uso da biodiversidade, em consonância com o paradigma internacional que se inaugurava.

    Nas décadas de 70 e 80 surgiram movimentos de opinião em que a “sociedade organizada” procurava influenciar Governos e forças vivas da economia para a adoção de nova atitude perante o Meio Ambiente, dada a sua importância como fator de sustentabilidade da vida na terra.  Os anos 80 viram o sucesso desse esforço, com oportunas iniciativas  em várias partes do planeta. O Brasil aprovou em 1981 a atual Lei de Proteção ao Meio Ambiente.  A Constituição de 1988 faz catorze menções ao meio ambiente e duas ao patrimônio genético, sendo o artigo 225 específico desses temas.  A preocupação ambiental nos países industrializados levou a legislações estritas de combate à poluição e de recuperação ambiental, com resultados impressionantes em tempo relativamente curto no que tange a sustentabilidade biológica e às modificações do clima.  A Costa Rica foi uma das pioneiras no esforço sistemático de modernização da exploração econômica sustentável de sua biodiversidade.  Criou para isso, em 1989, o INBIO – o Instituto Nacional de Biodiversidade – cujos negócios com a indústria farmacêutica tornaram-se logo mundialmente conhecidos.  Outros países tropicais em desenvolvimento, liderados em boa parte pelo Brasil, preocuparam-se com a possibilidade de tirar partido de sua mega-biodiversidade.  Esses vários movimentos eclodiram na Conferência Mundial de Cúpula do Rio de Janeiro, em 1992, e resultaram na adoção da Convenção da Diversidade Biológica.  A Convenção trouxe a consolidação do pensamento mundial sobre o assunto e foi influenciada de forma convergente pela “sociedade organizada” e pela base técnica das organizações públicas de todo o planeta.  Apesar de resistências pontuais de Governos protetores de economias fortes, a Convenção foi assinada por muitos países, sendo hoje 187 os que a ela aderiram.  O Brasil, um signatário fundador, teve a Convenção aprovada pelo Congresso Nacional em 1994, através do Decreto Legislativo No. 2 de 03/02/1994.  Em 1998, a sua obediência de execução é decretada pelo Presidente da República (Decreto No. 2.519 de 16 de março de 1998).

              Os pontos centrais de um regime de acesso aos recursos genéticos são a conservação e o aproveitamento sustentável da biodiversidade, ou seja: a regulamentação do seu acesso, compreendendo a forma de contratos e a proteção de todos os direitos de propriedade intelectual envolvidos, inclusive a relativa aos conhecimentos tradicionais.               

    Em todo esse debate, duas importantes vertentes se apresentam como dignas de uma reflexão aprofundada. A idéia mais imediata que vem à tona quando se fala na política de biodiversidade é a de um grande tesouro inexplorado, grande manancial de recursos materiais e financeiros, à espera de um empreendedor, que transforme essa grande mina em produtos e dinheiro. Esse é o tom da grande maioria dos textos e discursos publicados sobre o tema – a biodiversidade como o tesouro verde.

    Em que pese seja isso a mais cristalina verdade, como se demonstra pelos dados abaixo, não se poderá jamais deixar de ter em foco que a Convenção sobre Diversidade Biológica foi negociada e financiada para fazer frente ao problema global causado pela perda em escala geológica da biodiversidade, assim entendido como o aquecimento do planeta e a perda da diversidade de vida, a uma taxa detectada de 150 espécies por dia. Tal como os problemas referidos, a perda de biodiversidade se configurou como perigoso risco ambiental para o planeta, que ameaça, inclusive, sem exagero retórico, a existência do homem na terra. Esse, portanto, é o objeto central da Convenção, e que permanece cada vez mais necessitado de atenção nesse quadro de implementação do tratado.

    Assim, paralelamente à exploração dos benefícios propiciados pela bioprospecção e bioindústria, não se poderá jamais olvidar que parte dos recursos auferidos deverão ser destinados às tarefas de conservação da diversidade biológica. O mecanismo de compensação da Convenção foi criado para que esta seja  a primeira conta  paga, ao lado dos demais lucros, sob pena da conquista da última fronteira da natureza ser uma vitória de pirro.

    Além desses aspectos relacionados à biodiversidade em si, ao material genético que vem se tornando a matéria-prima do novo século, outro importante e estratégico ponto encaminhado pela Convenção reporta-se à proteção dos eventuais conhecimentos de povos tradicionais envolvidos no aproveitamento das plantas e animais. A sabedoria dos povos indígenas e comunidades locais fornece indicações preciosas a respeito da utilidade das espécies para cientistas e empresas. Além disso, seus costumes e práticas contribuíram e contribuem para a conservação e mesmo enriquecimento da biodiversidade. Acredita-se que em todos os setores envolvidos não haverá problemas para reconhecer o valor do conhecimento tradicional e remunerar seu aproveitamento. Entretanto, será necessário com a mesma urgência da regulamentação do acesso, definir-se esse regime “sui generis” de propriedade intelectual. Muitos problemas cercam esse tema, mas nada que não seja insuperável pela prática e pela norma. Os principais referem-se à titularidade desse direito, uma vez que é coletivo e muitas vezes partilhado por diferentes tribos.

    Para  enfrentar o problema global os países ricos em biodiversidade, como o Brasil, estão dando a sua parte, promovendo a conservação. A contrapartida para essa conservação é a exploração nacional e controlada desses recursos, e é aí que incide a abordagem mais puramente economicista do tema. De que maneira o Brasil, país mais biodiverso do planeta, à luz do paradigma da Convenção e da legislação que se busca implementar, deverá obter a melhor utilização de seus recursos genéticos?

    Focalizando mais precisamente esses aspectos econômicos da diversidade biológica, ponto que tem sido levantado com maior freqüência e visibilidade, registre-se, que a avaliação quantitativa da biodiversidade tem sido matéria comum na disciplina ambiental e na ciência econômica. No Brasil, há alguns anos Moacir Bueno Arruda, chefe da Divisão de Ecossistemas do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama), com a ajuda do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea), está estimando o valor patrimonial da biodiversidade brasileira. A tarefa terminará no próximo ano e já há uma estimativa de 2 trilhões de dólares, quatro vezes o Produto Interno Bruto (PIB) do país. O cálculo não tem a pretensão de ser exato, mas é uma boa aproximação. A metodologia tenta quantificar o valor dos recursos naturais existentes nas unidades de conservação brasileiras e os "serviços ambientais" que eles prestam (como regular o clima, gerar água potável e produzir alimentos).  Para não ficar apenas nessas abstrações, o jornalista Ricardo Arnt, em recente artigo, lista os seguintes investimentos reais na nossa biodiversidade:

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    Em Minas, o fundo FIR (Capital Partners), que dispõe de 75 milhões de dólares para investir e prepara o lançamento de um projeto de varredura das espécies nativas do cerrado.
     

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    A Fapesp está aplicando 14 milhões de reais no programa Biota para estudar as espécies do Estado de São Paulo em diálogo com seus Projetos Genomas
     

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    * Em Manaus, os 18 milhões de reais que serão investidos no Centro de Biotecnologia da Amazônia (40% já construído) darão um choque de qualidade na indústria química regional.
     

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    * No Rio de Janeiro, a Extracta conclui  testes sobre a reação de oito agentes de doenças às 30 000 substâncias do seu banco de espécies da Mata Atlântica.
     

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    * A Embrapa está investindo 14 milhões de reais no Projeto Genoma Funcional para decifrar o DNA da raiz de vários produtos agrícolas.
     

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    * Em Uberlândia, no Triângulo Mineiro, a americana Monsanto vai desembolsar este ano 40 milhões de dólares em pesquisas de melhoramento de grãos, híbridos e milho transgênico. Outra empresa, a suíça Syngenta, gastará 25 milhões com o mesmo objetivo.
     

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    * Fundos de investimento como o Votorantim Ventures, o Ventana Global e o “BankBoston Capital” estão analisando novos empreendimentos em biotecnologia.
     

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    * A Natura, a maior fabricante nacional de cosméticos, quer fazer parcerias com os povos do Parque Indígena do Xingu para aproveitar seus conhecimentos e lançar novos produtos.
     

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    * A área de biotecnologia farmacêutica do Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi) registrou 68 pedidos de patente em 1996, 150 em 1997 e 112 em 1998.
     

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    * O governo federal lança, neste semestre, o Programa de Biotecnologia e Recursos Genéticos. Até 2003, serão investidos 240 milhões de reais para fomentar o setor.

    Cabe notar que o considerável progresso político trazido pela Convenção é eivado pela visão peculiar de criar duas partes separadas e de interesses distintos.  De um lado, os países ricos de conhecimento, tecnologias e dinheiro, que necessitam acesso à biodiversidade aonde ela ainda existe, especialmente pelo potencial econômico do enorme patrimônio genético que nela se esconde.  Desejam esses que a biodiversidade restante, especialmente no Terceiro Mundo, seja conservada a qualquer custo, já que pouco resta da biodiversidade no mundo desenvolvido, destruída pelo homem através dos séculos e cujo valor para a vida na terra é hoje amplamente reconhecida.  Do outro lado, alinham-se os países pobres, que estariam dispostos a aceitar a tarefa de conservar a sua natureza e de permitir o acesso dos ricos ao seu patrimônio biológico e genético, em troca de conhecimentos e tecnologias para compensar os custos da conservação e da não ocupação de vastos territórios.  Embora a Convenção estimule a participação das comunidades científicas dos países detentores da biodiversidade nas pesquisas que lhe agregam valor, ela peca por não promover de forma mais incisiva o desenvolvimento sócio-econômico e técnico-científico nesses países.  Aqueles que, como o Brasil, já contam com mercado interno apreciável e  comunidade científica comparável em qualidade às melhores do mundo, precisam regular essas trocas de formas mais sofisticadas e mais favorecedoras de  trazer para dentro de suas economia parcelas crescentes das atividades comerciais e do desenvolvimento tecnológico que agregam valor aos produtos da Natureza.  Vender acesso a produtos “in natura” é sempre  começo de ascensão sócio-econômica e cultural,  hoje aberta a muitos países em desenvolvimento.  Mas certamente não é o caso do Brasil.  Devemos prestar atenção nesse ponto, pois ao regular a Convenção, podemos, por incúria, deixar-nos incorporar entre os destituídos de perspectivas

    As ações, tímidas ainda, existentes no Brasil deve-se ao fato do país deter a maior diversidade do planeta. Riquezas diversificadas jazem nas cadeias de nucleotídeos e nos fitoquímicos dos bosques brasileiros. Segundo a ONG - Conservation International -, dos 17 países mais ricos em biodiversidade do mundo (entre os quais figuram Estados Unidos, China, Índia, África do Sul, Indonésia, Malásia e Colômbia), o Brasil está em primeiro lugar: detém 23% do total de espécies do planeta. A Suíça tem apenas uma planta endêmica, a Alemanha, 19 e o México, 3 000. O Brasil tem 20 000 apenas na Amazônia. Adiciona-se a isso a variedade de espécies vegetais, de mamíferos, aves, répteis, insetos e peixes da Mata Atlântica, do cerrado, do Pantanal, da caatinga, dos manguezais, dos campos sulinos e das zonas costeiras. Apenas 5% da flora mundial foi estudada até hoje e só 1% é utilizada como matéria-prima. A biodiversidade brasileira, portanto, é o cofre de um patrimônio químico inexplorado de remédios, alimentos, fertilizantes, pesticidas, cosméticos, solventes, fermentos, têxteis, plásticos, celulose, óleos e energia, além de moléculas, enzimas e genes em número quase infinito.

    Devemos ter consciência de que ao concordar com o reconhecimento de direitos às culturas tradicionais e a sua inclusão no retorno de benefícios derivados das suas atividades e conhecimentos, o mundo civilizado ainda não soube prover uma receita clara, seja no plano jurídico, seja no sociocultural, para que tal retorno se dê de forma justa e que isso se passe sem comprometer os próprios traços culturais que desejamos manter como identidade cultural dessas comunidades.  Aqui, novamente, tem o Brasil condições excepcionais e a oportunidade de liderar o mundo no desenvolvimento de soluções criativas.  Precisamos para isso deixar que a sociedade se organize flexivelmente, e que, embora regulada, não se sinta inibida para experimentar e para otimizar receitas, à medida que aprende com a experiência crescente.   Convidemos o Primeiro Mundo a pensar e trabalhar junto conosco, mas guardemos o espaço vital para o exercício da inteligência social nacional, regional e local.  Devemos saber o que já foi feito por outras nações ricas em biodiversidade, mesmo que pequenas e destituídas do potencial brasileiro.  Cuidemos para não copiar, sem análise crítica, as soluções que escolheram, sob pena de nos prendermos a modelos que não se ajustam a um país  que movimenta uma das dez maiores economias do mundo, altamente posicionada em capacitação científica e com traços culturais característicos de grande nação.  Podemos e devemos experimentar com nossas próprias forças e nossas próprias cabeças.  Há muito que aprender e só tendo a humildade de aprender fazendo, errando e corrigindo, conseguiremos transformar biodiversidade em riqueza real, numa sociedade respeitadora, diversa e cônscia de suas possibilidades e responsabilidades coletivas.

    CONCLUSÕES  FINAIS

    1.       Todas essas idéias e perspectivas do imenso potencial para o Brasil, dependem da definição de nova legislação. Está em vigor Medida Provisória, editada em junho de 2000 e reeditada mensalmente (MP                       ). A MP condiciona a transferência de todo material biológico, inclusive o que o Brasil importa, à licença prévia de
    uma Comissão Interministerial encarregada de definir os critérios para contratos e parcerias. Ela deveria ter sido empossada em dezembro de 2000 e não foi.  Pela falta da Comissão e sem licenças, toda a bioprospecção e o intercâmbio biológico do país com o exterior estão parados. Igualmente, todas as teses de mestrado e doutorado, as pesquisas de campo (só no Estado de São Paulo são 400) e os negócios iniciados. O convênio com o Instituto Nacional do Câncer americano foi assinado em 1997. A idéia era criar um banco de extratos de plantas para testar células tumorais e bactérias ultra-resistentes. Entretanto, a coleta de material não foi autorizada pela Secretaria do Meio Ambiente de São Paulo, a pretexto de que não há ainda uma legislação sobre o assunto.

    2.       Como relator no Congresso Nacional da Medida Provisória em vigor, temos buscado todos os meios de aperfeiçoá-la, desenvolvendo cuidadosa coleta da opinião da sociedade organizada, dos cientistas nacionais, entidades empresariais relacionadas com o tema do desenvolvimento sustentável. O trabalho está em fase final e achamos que será possível, em breve, darmos contribuição sóbria, produzindo relatório convergente que induza ao consenso, sem descaracterizar a visão estratégica e política da matéria a regulamentar.

    3.       O desafio é, portanto, encontrar o equilíbrio nessa regulamentação. Há que se desenvolver os usos dos materiais genéticos no Brasil, incorporando tecnologias e capitais, sem, no entanto estabelecer princípios xenófobos e contrários ao desenvolvimento científico. A atração desses investimentos dependerá de uma legislação clara, explícita, que estabeleça as regras dos contrários e a proteção de cada direito envolvido. Não se quer uma legislação entreguista, mas apenas que dê segurança jurídica às parcerias que começam a se desenvolver. Argumenta-se que um possível modelo seja a terceirização, que já acontece nos Estados Unidos. Ali quem descobre novas moléculas são principalmente as empresas pequenas, que as licenciam para as empresas de porte global desenvolver e lançar os produtos.

    4.       Cabe reconhecer,  que a Medida Provisória segue com fidelidade as linhas mestras da Convenção da Diversidade Biológica.  As suas definições e seus conceitos são claros e os mecanismos que propõe, embora necessitando ainda de regulamentação, permitem a operação de  sistema complexo, mas definido no plano operacional.  Reconhece a regulação a nível nacional, sem impedir a atuação dos agentes públicos e privados que deverão dar vida ao objetivo de preservar a biodiversidade, num contexto de desenvolvimento sustentável e de valorização cultural, local e regional de todos os envolvidos.  Não obstante, a complexidade do formalismo burocrático, ainda se coloca como barreira de entrada a quem esteja tentando honestamente trabalhar para um desenvolvimento econômico e social através da biodiversidade.

    5.       Dito isto, há que se considerar que a Medida Provisória, na visão do Relator, merece reparos em alguns dos seus detalhes organizacionais e operacionais.  Dentre esses, ressalta, pela importância conceitual, a composição do proposto Conselho de Gestão do Patrimônio Genético, localizado no Ministério de Meio Ambiente como o órgão máximo do sistema, cujo referencial é ao mesmo tempo deliberativo e normativo.  Diz a MP que esse órgão é “composto de representantes de órgãos e de entidades da Administração Pública Federal”.  Por mais respeitáveis e capazes que sejam esses representantes, o espírito da Convenção pede uma ampla participação dos segmentos da Sociedade diretamente envolvidos no trato da biodiversidade e na sua exploração econômica, no Governo e fora dele.  Neste sentido, foi mais feliz a Senadora Marina Silva, quando em seu Projeto de Lei do Senado No. 306/95, propõe como órgão central uma “Comissão de Recursos Genéticos, a ser criada pelo Poder Executivo, composta por representantes do Governo Federal, dos Governos Estaduais e do Distrito Federal, da comunidade científica, de comunidades locais e populações indígenas, de agências de acesso, de organizações não-governamentais e de empresas privadas, em representação paritária de membros do Poder Público e de comunidades e instituições não-governamentais, incluídas entre estas últimas as instituições de ensino e pesquisa.”  Esse tipo de representação das forças vivas da sociedade, lado a lado com o Poder Público federal e estadual, é a fórmula de sucesso político e democrático de vários organismos governamentais, seja no MMA (CONAMA) e no MCT (CTNBio), seja em várias outras instâncias do Governo Federal.

    6.       Fica demonstrado, portanto, que está na hora das  instituições adotarem todas as medidas cabíveis e de sua respectiva competência para criar o ambiente favorável ao desenvolvimento das atividades relativas à conservação e uso sustentável de nossa biodiversidade, conscientes do fabuloso potencial desse componente de nosso patrimônio para a manutenção da vida no planeta e para o enriquecimento saudável do Brasil e dos brasileiros. No Congresso, deputados e senadores deverão, seguramente, encaminhar as discussões e análises e aparelhar o país com a legislação demandada, no prazo que as condições políticas permitirem, o que se pretende seja o mais breve possível.


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