Opinião
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13 de Outubro de 2001
ROBERTO CAMPOS
ROBERTO CAMPOS
O MEU DEPOIMENTOMorreu, na última terça, o Professor Roberto Campos. Tive a honra de ser seu colega na Câmara dos Deputados, durante duas legislaturas (1991/1999). Mesmo com a diferença de idade, sempre tivemos excelente convivência. Entre os liberais, ao contrário dos dogmáticos, são comuns as discordâncias e não fui exceção a essa regra. Mesmo assim, ele honrou-me com um elogio em sua obra prima “A Lanterna na Popa”, lançada em 1994. Até os mais ferrenhos adversários, reconheciam a sua coerência, humildade e inigualável senso de humor. Sem dúvida, um dos maiores pensadores do século XX. Quando criticado por ser ultraliberal, ele dizia sempre: “basicamente, eu sou um idiota da objetividade e um viciado da coerência”.
Lembro dois momentos que vivi ao lado do Professor Roberto Campos, a quem chamava sempre de “Embaixador”: uma viagem em 1992 (ele, eu, Nelson Jobim e Flávio Rocha) como observadores da Convenção Republicana realizada em Houston, Texas e o seu último discurso de despedida como Parlamentar (em 28.01.99), ocasião em lhe fiz um aparte, publicado no meu livro “OPINIÃO I” (pág. 114) e recebi longo agradecimento.
CONHECER A DISNEYWORLD
Quando viajamos para o Texas, surpreendi-me com um desejo por ele manifestado: queria sair dois dias antes para conhecer a Disneyworld e especialmente o “Epcot Center” em Orlando, FL. Nunca tinha ido lá e um neto lhe dissera que era “algo extraordinário”. Eu e Jobim aceitamos o convite e tivemos o prazer de vê-lo alegre como uma criança passeando entre os personagens de Walt Disney. Jantamos no restaurante “Alfredo” do Epcot Center e entre uma garfada de macarrão e um gole de vinho, ouvimos os seus depoimentos sobre o Governo de Juscelino Kubitschek, que servira a convite de Nereu Ramos; a sua época de Embaixador em Londres e EEUU e porquê apoiara a revolução de 64. Perguntei-lhe a razão de ter sido comunista e ele confessou que o comunismo ajuda a sair da miséria, mas é “incompetente para levar alguém à riqueza”. Antes, já lera pensamento de sua autoria, segundo o qual não se iludira com o “totalitarismo de esquerda por um raciocínio simples: Deus não é socialista. Criou os homens profundamente desiguais. Mudei e aprendi, por não ser imbecil. O mais grave são aqueles que nem mudam, nem aprendem”.
FUGINDO DO FURACÃO
Na semana que passamos em Houston, fazíamos um “happy hour” tardio (às 22 horas). O deputado Roberto Campos manifestava grande admiração pela idéia do “imposto único”, defendida à época pelo deputado Flávio Rocha e citava a competência empresarial de seu pai, Nevaldo Rocha, elogiando o grupo Guararapes. Voltamos por Miami e fomos hóspedes de Eliete e Nevaldo. Almoçamos numa sexta, em restaurante à beira mar e na segunda o prédio foi destruído pelo furacão que atingiu Miami. Sabendo do risco do furacão, o “Embaixador” preferiu viajar na mesma sexta para o Brasil. Eu e Jobim ficamos. Flávio e a família saíram da cidade. Vimos nas ruas o povo apavorado, colocando proteções nas casas e no aeroporto longas filas em busca de vagas nos vôos. Afinal, a experiência do “Embaixador” prevalecera: seria melhor ter viajado com ele na sexta. Quando o jato da Varig decolou, os passageiros bateram efusivas palmas. O perigo ficara para trás...
Outro momento que recordo é o discurso do Professor Roberto Campos, despedindo-se do Parlamento brasileiro, no final de janeiro de 99, após um mandato de Senador e dois de Deputado Federal. Contei mais de cem apartes. Fiz um deles, quando afirmei: “a minha palavra inicial é de agradecimento duplo: primeiro a Deus, por ter me dado a oportunidade de conviver com Vossa Excelência durante tantos anos. Depois, o agradecimento a Vossa Excelência pela contribuição dada ao Parlamento com as suas luzes, clarividência e equilíbrio”.
A sua palavra final na Tribuna Parlamentar foi ontológica. Começou confessando o fracasso de sua geração por não ter levado o Brasil ao desenvolvimento sustentável. “O país foi apenas um saltador de saltos curtos e não um corredor de resistência”. Disse não ter saudades de Brasília para ele “um bazar de ilusões e uma usina de déficits”. Apontou dois erros na Revolução de 1964, a qual servira como Ministro: os militares não fizeram a abertura econômica, antes da política e adotaram a política de reserva de mercado na informática, que atrasou o país em pelo menos 15 anos.
O ÚLTIMO DISCURSO
Para o Brasil crescer ele sugeriu satisfazer duas carências: a falta de poupança doméstica e as deficiências da educação básica. Tocou num barril de pólvora, quando afirmou: “o governo tem deslocado maiores recursos para a educação básica, mas não teve ânimo para desafiar o tabu da universidade pública gratuita, à qual os pobres têm difícil acesso e na qual os ricos e remediados recebem subvenção desnecessária”. Este é um tema em que discordo do Professor. A Universidade Pública é absolutamente necessária nas condições sócio-econômicas do Brasil. Todavia, concordo que é necessário reformá-la estruturalmente para que, além do ensino, ela se volte para a pesquisa e a extensão, gerando, inclusive, recursos para a sua auto-sustentação, sem prejuízo da dotação pública.
Buscando as causas do subdesenvolvimento brasileiro, ele comentou que um dos mais graves problemas dos povos subdesenvolvidos é não descobrir os verdadeiros inimigos. “Assim, por exemplo, os responsáveis pela pobreza brasileira não são o liberalismo, nem o capitalismo, em que somos noviços e destreinados e sim a inflação, a falta de educação básica e um assistencialismo governamental incompetente, que faz com que os assistentes passem melhor que os assistidos”.
Ao terminar o seu discurso, o “Embaixador” em voz pausada dirigiu-se ao plenário: “os que ficam nesta Casa têm pela frente uma formidável agenda reformista. Desejo-lhes como na oração do teólogo Reinhold Niehbuhr : que Deus lhes dê serenidade para aceitar as coisas que não possam mudar, coragem para mudar as que coisas que possam mudar e sabedoria para saber a diferença.
Coluna Publicada aos domingos
nos jornais O POTI e GAZETA DO OESTE
Natal e Mossoró - Rio Grande do Norte
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