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Brasília em Dia

  • 13 de Julho de 2012

    D. Eugenio, um bispo revolucionário

    2012-07-13-emdia

     

    Morreu o Cardeal D. Eugenio de Araújo Sales. Afirmo como Gonçalves Dias no Juca Pirama: “meninos, eu vi” quem era o bispo D. Eugenio, no início do seu apostolado em Natal. Aos quinze anos de idade fui trabalhar com ele na Emissora de Educação Rural de Natal, no chamado “Movimento de Natal” e no jornal, também da Arquidiocese, “A ORDEM. O jovem bispo era um homem que acreditava na comunicação social.

    Grande injustiça chamá-lo de conservador, por ter se aliado a ala da Igreja que combateu o modismo do frei Leonardo Boff, quando tentou substituir Cristo por Karl Marx e o simbolismo do crucifixo pela luta de classes, através da teoria da libertação.

    No plano das ações sociais, D. Eugenio era um bispo revolucionário.  Pregava a doutrina social da Igreja, a partir dos ensinamentos das encíclicas “Rerum Novarum”e “Mater et magistra” de João XXIII. Talvez, o epíteto de conservador lhe tenha sido atribuído, pelo fato de não concordar com as “ligas camponesas” do deputado Francisco Julião, que no nordeste pregava abertamente a luta de classe. Ele implantou um trabalho de treinamento de líderes rurais cristãos e disseminou os sindicatos rurais.  Evitou que o marxismo se ampliasse no Rio Grande do Norte, um dos poucos estados onde não prosperaram as “ligas camponesas”. Setores da revolução de 1964 chegaram a confundir o trabalho social da Igreja com o das “Ligas”. Várias vezes, os colaboradores de D. Eugênio foram acusados de “comunistas”, com ameaças de prisões.  Jornalista e estudante de direito pertencente a sua equipe prestei depoimentos ao DOPS (Departamento de Ordem Política e Social), sob suspeita de subversão, por pronunciar palestras para agricultores, dando-lhes noções de organização sindical democrática.

    No último dia 9, os olhos lagrimerajarm ao ler a notícia de que falecera o “padre de Acari”, cidade do sertão do RN, onde nasceu. A memória logo recordou alguns fatos ligados ao “Movimento de Natal”, quando adolescente convivi com o bispo Eugenio Sales, que congregava e motivava a todos, esbanjando lucidez e forte liderança.

    As maiores recordações vieram do período em que trabalhei no jornal “A Ordem”.  À época, mesmo repórter de jornal pequeno, ganhei aos 17 anos, o prêmio Esso Regional de reportagem, com a série “A cidade por dentro”, que virou pelo avesso a capital do RN. Cheguei a ser denunciado como “comunista”, por publicar foto de casa de luxo de um deputado, ao lado de casa em favela. D. Eugenio sorriu ao me comunicar o ocorrido. Logo depois, ganhei outro prêmio nacional do Ministério da Aeronáutica, pela reportagem sobre a Base Aérea de Natal e a sua presença na II Guerra Mundial.

    D. Eugenio trouxe de Portugal para dirigir A ORDEM, o português Manoel Chaparro (hoje professor de jornalismo na PUC de SP), perseguido pela ditadura de Salazar. Chaparro revolucionou o jornalismo potiguar. Recebi dele missões difíceis e consegui cumpri-las. Por exemplo, entrevistei Carlos Lacerda no Palácio Guanabara, com a mídia nacional me empurrando para que não tivesse acesso ao governador. Entusiasmado com a obra de D. Eugenio Sales no campo social perguntei-lhe se conhecia esse trabalho da igreja. Lacerda ajeitou os óculos e disparou: “a Igreja tem o dever de pescar almas. Ocorre que ela está colocando na ponta do anzol iscas sociais e se preocupa mais com a isca do que com o peixe”. Embora lacerdista convicto, não gostei do sarcasmo.

    Em junho de 1966, quando trabalhava no Diário de Pernambuco e na sucursal da Folha em Recife, A ORDEM pediu que cobrisse o retorno da Europa do Ministro da Guerra, Costa e Silva, candidato a Presidente da República. Cheguei ao aeroporto dos Guararapes ainda madrugada. De repente, ouvi fortíssima explosão. A poucos metros de onde estava explodiu uma bomba, que matou um jornalista, um almirante e feriu seriamente 13 pessoas. Escapei por muito pouco. Certamente as orações de D. Eugenio me ajudaram.

    Aconteceu comigo a dádiva de ter merecido a confiança de D. Eugenio Sales e trabalhar nos órgãos de comunicação por ele dirigidos, como arcebispo de Natal. Aprendi lições de humanismo, ética na informação e respeito à pessoa humana. Com a morte de D. Eugenio Sales, a Igreja perdeu um dos seus sacerdotes mais virtuosos. O RN orgulha-se de tê-lo eternamente como filho Ilustre.

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